quinta-feira, 14 de fevereiro de 2008

na minha rua.


na calçada em frente e abaixo do meu apartamento moram umas pessoas. o teto delas é de papelão, madeira tosca e saco de lixo preto. a gente divide o mesmo barulho de trem. eu gosto do barulho do trem. elas devem odiar porque só tem um muro dividindo os trilhos delas próprias. um dia o cachorro delas fugiu e descobriu aquele buraco no muro por onde uma vez passou o neto do dono do chaveiro do bairro pra brincar e acabou atropelado e morto porque o tenis dele ficou preso em baixo do ferro do trilho e o maquinista não conseguiu parar. eu ouvi só a buzina e um grito. mas voltando ao osmar, o cachorro. bom, com o osmar aconteceu a mesma coisa mas só acharam seu corpo depois. tinha um carro de bombeiro parado de noite na rua iluminando tudo e procurando alguma coisa nos trilhos. não era o osmar, lógico. mas foi ele que acharam, claro. quer dizer, o cadáver dele. eu sei que era o cadáver pelos gritos de desespero do dono. eu nunca vou esquecer essa voz. essa dor do mendigo, do dono do osmar chamando ele - osmaaaaar- como se ele fosse ressucitar. já faz um tempo isso. uns anos talvez. os vizinhos da frente continuaram morando na calçada. tirando o dia da tragédia do osmar e umas brigas de família quando algum parente vem visitar e não cabe todo mundo no barraco tudo loco da pinga eles jamais causaram tumulto aqui na barra funda. mas como morador de condomínio cafona pré fabricado com parede de gesso e nome de bairro em miami não gosta de ver gente pobre morando na rua que ele passa com seu carro importado que ele ta pagando em 90 parcelas, algum filho da puta do prédio chamou a polícia e eles vieram com o carro da prefeitura limpar a calçada e varrer a sujeira que tava estragando a paisagem belíssima do miami gardens. foi só sirene de gambé e de novo aquele grito, aquela voz. cada pedaço de papelão, de madeira tosca que ia voando pra dentro do caminhão a voz ia ficando mais alta. e quando acabou todas eu vi o dono do osmar ali sentadinho com a mão na cabeça chorando e pedindo pra não levarem ele. ele gritava- leva tudo mas deixa eu!! não deixaram. ele foi chorando. o mesmo choro do dia do osmar. na calçada em frente e abaixo do meu apartamento não moram mais umas pessoas. eu continuo aqui no mesmo 13º andar...ouvindo o barulho do trem e olhando aquela calçada que um dia morou o osmar. que tem o muro com o buraco que dá nos trilhos. o mesmo buraco que já levou pra morte ele e o neto do dono do chaveiro do bairro.

4 comentários:

SUPERBEAT disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
SUPERBEAT disse...

amiga, amei o blog e essa histórinha com cara de crônica....tadinho do osmar...vou visitar sempre

=)

bitter sweet disse...

eu gosto do barulho do trem.
brimingham - são paulo.

Anônimo disse...

kkkkk
to amando os textos amiga...minha escritora preferida



nega